Estaria a cannabis altamente concentrada levando ao primeiro episódio de psicose?

O uso regular de cannabis concentrada está fortemente ligado à incidência de psicose, de acordo com evidências epidemiológicas. Robin Murray (King's College, Londres, Reino Unido) diz que temos boas razões para acreditar que a conexão é causal - e não mediada por um fator de confusão, como um risco genético de esquizofrenia aumentando a propensão ao uso de cannabis.

Uma pessoa pode ter uma alta pontuação de risco poligênico para esquizofrenia e desenvolver psicose, mesmo quando usa pouca ou nenhuma cannabis. Outra pessoa pode desenvolver psicose se consumir grandes quantidades de cannabis, mesmo que tenha baixa vulnerabilidade genética, disse Robin Murray no CINP 2021 (Congresso Virtual do Colégio Internacional de Neuropsicofarmacologia).

Para a maioria das pessoas, esses fatores de risco são independentes e aditivos. Há poucas evidências para a interação gene-ambiente, disse ele. Por exemplo, dados do Biobank nacional do Reino Unido sugerem que a pontuação de risco poligênico para esquizofrenia tem apenas um pequeno efeito na propensão ao uso de cannabis.

A predisposição à esquizofrenia não explica por que as pessoas usam cannabis1

 

Devemos aconselhar contra o uso diário de cannabis concentrada

Essa descoberta tem implicações importantes, pois, embora não possamos fazer nada sobre nossos genes, o uso excessivo de cannabis é evitável, argumentou o professor Murray.

E ele acredita que a principal razão pela qual enfrentamos níveis crescentes de psicose é que o teor de tetra-hidrocanabinol (THC) da cannabis aumentou massivamente desde que se tornou uma droga recreativa popular na década de 1960, passando de uma concentração de cerca de 3% para 20% nos primeiros anos do século 21.1

O teor de THC na cannabis aumentou massivamente desde a década de 1960: de cerca de 3% para 20%

A evidência de que o uso regular de cannabis de alta concentração é uma causa componente da psicose é agora suficiente para as mensagens de saúde pública delinearem o risco, acredita Robin Murray. Isso se dá especialmente desde que a descriminalização e a legalização estão levando ao aumento do uso, sugerindo que a incidência de psicose é passível de aumentar.

 

Por que a incidência de psicose em Londres é seis vezes maior que em Palermo?

De acordo com dados de um estudo pan-europeu, existe uma diferença de até oito vezes na incidência de psicose entre os seis países estudados.2 A incidência é maior no norte em comparação ao sul da Europa, e maior nas grandes cidades em comparação a pequenas cidades ou áreas rurais.

A incidência de primeiro episódio psicótico cairia substancialmente se a cannabis altamente concentrada não estivesse mais disponível

As incidências são, por exemplo, de 62 por 100.000 pessoas/ano em Londres, 47 em Amsterdã e 45 em Paris, mas apenas 13 em Barcelona e 11 em Palermo.

A razão, acredita o Professor Murray, reside nas diferenças na proporção da população que usa cannabis de alta concentração (concentração de THC superior a 10%) diariamente. A correlação entre o uso e a incidência de psicose é de 0,8.

 

Relação dose-resposta

Dentro das cidades, há uma relação consistente entre a exposição de um indivíduo ao THC e o risco de psicose.3

Assim, em Londres, quando comparado com não-usuários, alguém que faz uso de cannabis concentrada uma vez por semana tem o dobro do risco de apresentar um primeiro episódio de psicose. Em um usuário diário de cannabis concentrada, o risco relativo é 5.

A correlação entre o uso cannabis concentrada e a incidência de psicose é alta

Além desses dados epidemiológicos que mostram uma relação dose-resposta entre o nível de exposição à cannabis e o risco de psicose posterior, há evidências de que o uso contínuo por aqueles com psicose já estabelecida está associado a um desfecho pior do que naqueles que descontinuam o uso.Isso sugere um papel causal.

O professor Murray também aponta para experimentos que mostram que a administração de THC pode induzir psicose transitória em indivíduos saudáveis.1

 

 

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Referências

1. Murray RM et al. World Psychiatry 2016;15:195-204

2. Jongsma HE et al. JAMA Psychiatry 2018;75(1):36-4

3. Di Forti M et al. Lancet Psychiatry 2019; 427-436

4. Schoeler T et al. Lancet Psychiatry 2016;3:215-225