Fatores preditivos de reações adversas a fármacos e mediadores inflamatórios associados à depressão

Resumo de um simpósio no congresso do Colégio Europeu de Neuropsicofarmacologia (ECNP) em Viena, em 2016, que abordou a possível identificação precoce de indivíduos em risco para depressão e a possibilidade de recursos para a escolha de tratamentos potencialmente mais bem tolerados por meio da classificação dos pacientes de acordo com o risco de reações adversas específicas.

      Cerca da metade dos pacientes deprimidos suspende o tratamento farmacológico antes da orientação do seu médico, e muitos interrompem o tratamento no prazo de três meses. Dados históricos sugerem que esse problema era mais comum com os antidepressivos tricíclicos do que com os inibidores seletivos de recaptação de serotonina (ISRS), mais recentes, mas a adesão ao tratamento continua longe do ideal, e isso se deve em grande parte às reações adversas. 
Está claro que o risco de apresentar efeitos adversos específicos não é o mesmo para todos os pacientes. Stefan Kloiber, do Centro de Dependência e Saúde Mental da Universidade de Toronto, no Canadá, apresentou dados promissores e interessantes indicativos de que a combinação de conhecimentos sobre os fatores de risco clínicos e biológicos pode permitir a previsão de quais são os pacientes com maior risco para desenvolver reações adversas a um fármaco específico. A individualização do tratamento deve, por sua vez, melhorar a adesão e consequentemente o resultado terapêutico. 

Farmacogenômica, intervalo QT e ganho de peso 

     Dada a importância do sistema do citocromo P450, é possível que as variantes genéticas das enzimas CYP sejam relevantes em relação ao risco de toxicidade, mas não há estudos clínicos randomizados que comprovem que o uso de testes farmacogenômicos das enzimas CYP melhore os resultados em comparação ao tratamento habitual. 

Não podemos mudar o peso inicial do paciente nem a gravidade inicial da doença, mas podemos escolher o fármaco que recomendamos

O prolongamento do intervalo QT induzido por fármacos é um fenômeno importante, e o risco de que isso ocorra é maior entre as mulheres e as pessoas com doença cardíaca prévia, com desequilíbrio eletrolítico, que fazem uso de diuréticos, com prolongamento do intervalo QT inicial e com mutações associadas à síndrome do prolongamento do intervalo QT congênito. Esses fatores poderiam ser reunidos em um instrumento preditivo, mas ainda não o temos.

Talvez pudéssemos prever e influenciar o risco de ganho de peso, grande parte do qual é específico de cada fármaco. No projeto Munich Antidepressant Response Signature (MARS), que analisou o tratamento farmacológico do transtorno depressivo maior (TDM) em mais de 700 pacientes, a alteração de peso durante um período de cinco semanas variou da redução de quase 10 kg ao ganho de 12 kg, com aumento médio de 0,7 kg. Grande parte do ganho de peso é específica de cada fármaco e, portanto, evitável. 
Os fatores clínicos relacionados ao ganho de peso, validados em uma coorte de pacientes investigados na Universidade de Münster, foram: IMC inicial baixo ou normal, gravidade da depressão, presença de sintomas psicóticos e uso de medicação com associação conhecida ao ganho de peso. 
Com base nos resultados desses dois estudos observacionais, o Dr. Kloiber et al. desenvolveram uma escala de risco de 0 a 4 que inclui os seguintes fatores: IMC de 25 kg/m2 ou menos, pontuação na Escala de Avaliação da Depressão de Hamilton (HAM-D) superior a 20, presença de sintomas psicóticos e uso de antidepressivo com potencial de ganho de peso. O risco de ganho de peso aumenta significativamente quando a pontuação atinge 3, e mais ainda quando é igual a 4. 

Um participante perguntou se o médico (ou o paciente) pode atenuar alguns desses fatores de risco de ganho de peso. No que se refere ao IMC ou à gravidade ou natureza dos sintomas depressivos iniciais, não se pode fazer muito, disse o Dr. Kloiber, mas se o paciente apresentar dois ou três fatores de risco será possível decidir não usar um fármaco particularmente associado ao ganho de peso, pois isso aumentaria de forma substancial a probabilidade de ocorrência dessa reação adversa. É claro que também existem fatores genéticos. Em um estudo do genoma completo (que está em preparação e será preciso replicar), observou-se um sinal em um polimorfismo de nucleotídeo único (PNU) em determinado gene anteriormente relacionado a distúrbios metabólicos ou de peso, portanto é plausível que esse polimorfismo genético tenha seu papel.

Biomarcadores do sistema imunológico e depressão

Michelle Roche, da Universidade Nacional da Irlanda, em Galway, analisou as evidências da participação das citocinas inflamatórias. 
As crianças com níveis elevados de IL-6 têm maior risco de desenvolver depressão antes dos 18 anos. Os efeitos antidepressivos induzidos pela quetamina estão associados a reduções da IL-6 e do TNF-alfa, e os anticorpos anti-TNF podem ser eficazes nos casos de pacientes com TDM e concentração elevada de proteína C-reativa no início. 
Estudos anatomopatológicos de cérebros de pacientes com depressão demonstraram a presença de células microgliais ativadas, que liberam mediadores pró-inflamatórios, enquanto dados de estudos in vivo por PET com radiomarcação da proteína translocadora (expressa na micróglia) relacionam a extensão da ativação à maior gravidade da depressão. 
Em conjunto, muitos dados sugerem a existência de uma relação entre o sistema imunológico e o cérebro na depressão, o que poderia ter efeitos relevantes sobre a neurogênese e a plasticidade sináptica. Fica evidente que a inflamação não é específica da depressão, observando-se, por exemplo, nas doenças autoimunes. Mas estas, por sua vez, parecem aumentar o risco de depressão.