Destaques do 36º Congresso do European College of Neuropsychopharmacology – ECNP (Colégio Europeu de Neuropsicofarmacologia)

O Congresso anual do Colégio Europeu de Neuropsicofarmacologia (ECNP - European College of Neuropsychopharmacology) é o maior encontro da Europa em neurociência aplicada e translacional.1 Quase 6.400 psiquiatras, neurocientistas, neurologistas e psicólogos e outros profissionais de saúde de todo o mundo se inscreveram para o último encontro em Barcelona, Espanha, para compartilhar e discutir resultados de pesquisas e ideias no campo da neurociência. Havia um objetivo implícito para todos os participantes, que foi resumido na declaração do presidente do ECNP, Martien Kas: "Avançar com a ciência do cérebro, promover melhores tratamentos e aprimorar a saúde do cérebro."2

Aprimorar a saúde do cérebro

Várias doenças do cérebro foram discutidas no 36º Congresso do ECNP, desde transtorno bipolar a transtorno depressivo maior (TDM) e esquizofrenia. O fardo decorrente das necessidades não atendidas desses transtornos, tanto no paciente como no sistema de saúde, foram apresentadas em diversas sessões. Uma delas destacou que muitos pacientes com TDM ainda relatam resultados abaixo do ideal, incluindo baixas qualidade de vida relacionada à saúde e funcionalidade em geral, apesar do tratamento antidepressivo.3-5 O impacto dos transtornos depressivos na saúde do cérebro também pode levar a comorbidades físicas, com um risco 64% maior de desenvolver doença arterial coronariana em comparação a pessoas sem depressão.6

Adultos com transtorno depressivo possuem um risco 64% maior de desenvolver doença arterial coronariana6

Em resposta, parece haver um esforço contínuo nos últimos anos para construir um quadro mais complexo do TDM, em vez de uma condição singular. Identificar e direcionar dimensões específicas no TDM, como cognição, embotamento afetivo e anedonia, pode melhorar os desfechos relatados pelo paciente e resultar em uma recuperação funcional completa.7-10

 

Promover melhores tratamentos

O tratamento de outros transtornos mentais, como a esquizofrenia, já está bem estabelecido. No entanto, apesar do número de medicamentos antipsicóticos disponíveis, o manejo de sintomas cognitivos e negativos ainda é uma necessidade clínica amplamente não atendida na esquizofrenia.Os antipsicóticos atualmente disponíveis oferecem apenas um benefício modesto para esses sintomas, embora muitas vezes eles tenham o maior impacto na vida diária dos pacientes.11 Apesar disso, os antipsicóticos ainda desempenham um papel crucial na prevenção da recidiva durante o tratamento de manutenção. Porém, com mais de 50% dos pacientes não aderindo à sua prescrição inicial após a hospitalização, o manejo da esquizofrenia pode precisar ser reavaliado.12

Mais de 50% dos pacientes com esquizofrenia não aderem à sua prescrição inicial de antipsicóticos após a hospitalização12

Várias sessões no 36º congresso do ECNP analisaram o potencial de melhora para o tratamento da esquizofrenia. Os princípios da tomada de decisão compartilhada e da entrevista motivacional foram destacados como ferramentas poderosas para engajar os pacientes e melhorar a adesão.13 Ao reconhecer o significado das preferências do paciente e incorporá-las aos planos de tratamento, os psiquiatras podem aprimorar a qualidade geral do cuidado aos indivíduos vivendo com esquizofrenia e reduzir o impacto devastador das recaídas em suas vidas.13,14

Com a preferência do paciente em mente, os benefícios de determinados antipsicóticos foram avaliados, bem como um estudo demonstrou que os antipsicóticos injetáveis de ação prolongada foram preferidos por 77% dos pacientes em comparação aos medicamentos orais,14 o que poderia explicar sua maior taxa de adesão e menos recaída, reinternação e mortalidade.15,16

Em um estudo, os antipsicóticos injetáveis de ação prolongada foram preferidos por 77% dos pacientes quando comparados aos medicamentos orais para o tratamento da esquizofrenia14

 

Avançar com a ciência do cérebro

Não foram apenas as opções de tratamento atuais que foram debatidas nesta edição do congresso, mas também perspectivas futuras na forma de potenciais novos agentes. Embora nossa compreensão da esquizofrenia tenha evoluído, todos os tratamentos farmacológicos atuais operam utilizando o mesmo mecanismo – bloqueio do receptor de dopamina D2 – e o fazem há mais de 70 anos. Novos alvos de tratamento podem ser particularmente benéficos em domínios de sintomas que não são bem atendidos por medicamentos existentes.17

Os receptores muscarínicos de acetilcolina (RmACh) são alvos promissores para a intervenção de medicamentos em vários transtornos cerebrais devido ao seu envolvimento na regulação de comportamentos complexos, como cognição, movimento e recompensa.18 Em particular, ter como alvo o receptor M1 pode melhorar a cognição e reverter os déficits de memória na esquizofrenia. Como resultado, vários moduladores para M1 entraram em estudos clínicos.18

O receptor M1 como alvo pode melhorar a cognição e reverter os déficits de memória na esquizofrenia18

O TAAR1 (receptores associados a aminas-traço 1) é outro receptor alvo com potencial terapêutico, com agonistas atualmente em desenvolvimento clínico. Em modelos pré-clínicos, foi demonstrado que ele modula neurotransmissores importantes para a esquizofrenia, incluindo dopamina, serotonina e glutamato, e pode fornecer uma maneira única de modular estados hiperdopaminérgicos sem bloquear os receptores.19

 

O congresso terminou no dia 10 de outubro com as últimas de suas 80 sessões únicas, após promover com sucesso a comunicação de ideias, descobertas e melhores práticas para todos os participantes. À luz da prospecção de novas metas de tratamento, a expectativa é alta para o próximo congresso do ECNP, em Milão.

 

 

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Referências

  1. ECNP Congresses. Available at: https://www.ecnp.eu/ecnpcongress/congresses. Accessed October 2023.
  2. Welcome and Keynote session – Making and breaking memories. Online session at: 36th ECNP congress; 2023 October 7; Barcelona and virtual.
  3. Ishak WW, et al. Qual Life Res 2013;22:585-96.
  4. Dionisie V, et al. J Clin Med 2023;12:4628.
  5. Daly EJ, et al. Ann Clin Psychiatry 2010;22:43-55.
  6. Heart disease and depression: A two-way relationship. Available at: https://www.nhlbi.nih.gov/news/2017/heart-disease-and-depression-two-wa…. Accessed October 2023.
  7. McIntyre RS, et al. CNS Spectr 2015;20(Suppl 1):20-30.
  8. Cao B, et al. Front Psychiatry 2019;10:17.
  9. McIntyre RS, et al. Neuropsychiatr Dis Treat 2021;17:575-85.
  10. Fagiolini A, et al. J Affect Disord 2021;283:472.
  11. Maroney M. Ment Health Clin 2022;12(5):282-99.
  12. Tiihonen J, et al. Am J Psychiatry 2011;168(6):603-9.
  13. Elwyn G, et al. Ann Fam Med 2014;12(3):270-5.
  14. Blackwood C, et al. Patient Prefer Adherence 2020;14:1093-1102.
  15. Kishimoto T, et al. Lancet Psychiatry 2021;8(5):387-404.
  16. Taipale H, et al. Schizophrenia Research 2018;197:274-80.
  17. McCutcheon RA, et al. JAMA Psychiatry 2020;77(2):201-10.
  18. Moran SP, et al. Trends Pharmacol Sci. 2019;40(12):1006-20.
  19. Dedic N, et al. Int J Mol Sci 2021;22(24):13185.