Como os genes estão envolvidos na adequação do tratamento psiquiátrico?

Os psiquiatras têm necessidade de entender os estudos de associação genômica ampla (GWAS - do inglês genome-wide association studies), a farmacogenômica e as pontuações de risco poligênico (PRS – do inglês polygenic risk scores), para que possam adaptar o tratamento para seus pacientes. Atualmente, as utilidades dessas técnicas estão evoluindo. Os GWAS são utilizados em pesquisas; os testes farmacogenômicos são apenas indicados ocasionalmente na clínica para melhorar os resultados do tratamento, e espera-se que o teste de PRS desempenhe um papel substancial na avaliação de risco de doença, subtipos de doença e resposta ao tratamento no futuro, conforme explicado pelo professor John Nurnberger, da Indiana University School of Medicine, Indiana, para uma grande plateia de médicos no Psych Congress 2019.

Não um gene, mas múltiplos fatores genéticos

Os GWAS rastreiam polimorfismos de nucleotídeo único (SNP) de todo o genoma em intervalos de 10–50 Kb. Milhares de amostras são necessárias, declarou o professor Nurnberger. As descobertas relevantes para a psiquiatria até agora incluem:

  • a identificação de 128 associações independentes que abrangem 108 loci definidos de forma conservativa em esquizofrenia1
  • loci significativos contendo genes que codificam canais iônicos, transportadores de neurotransmissores e componentes sinápticos no transtorno bipolar (TB)2

A Farmacogenômica fornece a base para medicamentos de precisão e deve melhorar o atendimento ao paciente

Atualmente, os testes farmacogenômicos são apenas ocasionalmente indicados na clínica

As respostas e os perfis de eventos adversos dos tratamentos farmacológicos são modulados por fatores genéticos. Por exemplo, o sistema enzimático do citocromo P450 (CYP) está envolvido no metabolismo de antidepressivos e antipsicóticos. Duas dessas enzimas — CYP2C19 e CYP2D6 — são apresentadas nos avisos da FDA, que destacam uma dose máxima de um determinado medicamento para metabolizadores lentos dessas enzimas.

Os testes farmacogenômicos, portanto, fornecem a base para a medicina de precisão em psiquiatria e, com um desenvolvimento cuidadoso através de ensaios clínicos, devem melhorar o atendimento ao paciente, disse o professor Nurnberger.3

Pacientes que receberam terapia guiada por farmacogenética tiveram uma probabilidade de 1,71 vezes maior de obter remissão dos sintomas

Uma análise sistemática e uma meta-análise de 1737 participantes elegíveis em cinco ensaios clínicos randomizados (RCTs) que examinaram as ferramentas de apoio à decisão (FADs) guiadas por farmacogenética no transtorno depressivo maior (TDM) mostraram que os indivíduos que receberam terapia de FADs guiadas por farmacogenética tiveram 1,71 vezes maior probabilidade de obter remissão dos sintomas, em comparação aos indivíduos que receberam tratamento habitual.4

O estudo Genomics Used to Improve Depression Decisions (GUIDED) foi um RCT de 1167 pacientes ambulatoriais. O teste farmacogenômico foi eficaz para melhorar as taxas de resposta e remissão entre pacientes com resistência ao tratamento, particularmente para pacientes tratados com medicamentos incompatíveis com seu perfil genético. Entretanto, o resultado primário – melhora dos sintomas na semana 8 – não atingiu significância estatística.5

Todavia, a Declaração da Sociedade Internacional de Genética Psiquiátrica sobre Testes para Escolha do Tratamento, de 2019, comenta que “as evidências para apoiar o uso generalizado de outros testes farmacogenéticos no momento são inconclusivas, porém quando os resultados dos testes farmacogenéticos já estão disponíveis, os fornecedores são incentivados a integrar essas informações nas decisões de seleção e de dosagem de medicamentos. As informações genéticas para o CYP2C19 e o CYP2D6 provavelmente seriam mais benéficas para indivíduos que tiveram uma resposta inadequada ou uma reação adversa a um ensaio antidepressivo ou antipsicótico anterior.”

A qualidade e a utilidade dos testes farmacogenômicos devem aumentar ao longo do tempo

É razoável considerar testes farmacogenômicos comerciais para pacientes resistentes ao tratamento, disse o professor Nurnberger, porém o ceticismo é justificado porque:

  • eles contêm uma combinação de avaliações bem apoiadas (p. ex., CYP2D6) e testes mal apoiados (p. ex., avaliação do transportador de serotonina)
  • as recomendações, em geral, são baseadas em algoritmos proprietários que combinam informações de diversas variantes de genes utilizando regras não reveladas aos profissionais ou consumidores
  • a maioria das empresas de testes não realizou ensaios controlados de seus produtos

As PRS deverão desempenhar um papel substancial na avaliação e na resposta ao tratamento no futuro

A PRS reflete a carga genômica das variantes de risco genético para uma doença particular em um indivíduo, disse o professor Nurnberger, e os métodos para calculá-las foram desenvolvidos nos últimos 10 anos. Cada variante de risco recebe um valor com base no tamanho do efeito, e cada indivíduo em uma amostra alvo recebe uma pontuação total com base no número e no valor das variantes de risco que ela carrega.

A força preditiva ideal de uma PRS é obtida por meio de centenas ou milhares de variantes.6 A força preditiva atual da PRS para discriminação entre pacientes e controles é de aproximadamente 82% para esquizofrenia, 65% para TB, 58% para TDM, e 54% para ansiedade,7 afirmou o professor Nurnberger. A força preditiva pode ser aumentada:

  • utilizando métodos estatísticos
  • ponderando a expressão gênica ou outros processos biológicos
  • aumentando tamanhos de amostra por amostra de descoberta8,9

A PRS pode indicar uma tendência para o desenvolvimento de TDM

Um estudo publicado recentemente demonstrou  uma tendência da PRS para o TDM está associada à primeira depressão na população em geral.10

O professor Nurnberger concluiu que, embora uma PRS geralmente não seja, até o presente momento, informativa quanto ao status da doença para diagnósticos psiquiátricos em nível individual, com o desenvolvimento adicional, espera-se que a PRS resulte em utilidade clínica substancial na avaliação do risco de doença, dos subtipos de doença e da resposta ao tratamento no futuro.6

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Referências

  1. Ripke S, et al. Nature. 2014;511:421–7.
  2. Stahl EA, et al. Nat Genet. 2019;51:793–803.
  3. Nurnberger J, et al. J Clin Psychiatry. 2019;80(1).
  4. Bousman C, et al. Pharmacogenomics. 2019;20:37-47.
  5. Greden JF, et al. J Psychiatr Res. 2019;111 :59-67.
  6. Fullerton J, Nurnberger J. F1000Res. 2019; 8: F1000 Faculty Rev-1293.
  7. So H, et al. Bioinformatics 2017;33:886–92.
  8. Khera AV, et al. Nat Genet. 2018;50:1219–24.
  9. Wang D, et al. Science. 2018;362(6420).
  10. Musliner K, et al. JAMA Psychiatry. 2019;76:516–25.